-- Ô, Zé, você já viu uma negra Zulu?
Estávamos num bar da Lagoa e a pergunta, assim de qualquer maneira, no meio de um silêncio qualquer, intrigou meu amigo.
-- .....?
-- É, Zé, uma negra Zulu. Dessas negras altas, bonitas, que andam que parecem estar de andas... devagar e altivas...
-- .... ?
-- Te pergunto porque eu vi. E não sei com quem dividir isso.
-- Tá bom, Carlos. Me fale, então dessa tua negra Zulu....
-- É o seguinte: segunda-feira fui a São Paulo ver um caso qualquer lá do escritório. Aí me encontrei com uma amiga com quem nunca havia estado pessoalmente....
-- E...
Tomei um gole de chopp. Mais outro.
-- E que, quando eu a vi chegando no restaurante fiquei de pé. Ela é bem mais alta que eu. E eu não sabia disso. Fiquei assim, meio que pego de surpresa, envergonhado... que besteira...
-- Sim, é uma tremenda besteira, mas eu entendo. Essa coisa da supremacia masculina, tamanho e coisa e tal...
-- É! Tamanho é documento sim, Zé... Não só de altura... Você já viu esses filmezinhos pornôs em que rola a maior acrobacia? Em que um pau grande, liso e duro de pedra vira um animal mitológico? Mas isso não vem ao caso...
Mais um gole e pedi mais um. Enquanto esperava, continuei.
-- Além de alta a mulher, a negra Zulu, era linda, meu chapa!
-- Sei que você gosta de negras, João. Até aí, nada.
-- Nada-nada, Zé. A Kill é belíssima, sob qualquer padrão que você escolha.
-- Kill?
-- É, Kill é o apelido dela. Bem a propósito, afinal. Compõe, canta, escreve, e é linda, bêtcho!
-- OK. E então?
-- Bem... me levantei, me envergonhei, ela sorriu, sacando a minha vergonha, aceitou a cadeira que eu puxei e sentou, me dizendo “Carlinhos...”. Ái, ái, ái – fiquei vendido!
-- Mas e aí, rapaz, como foi o jantar? Do que vocês falaram? Rolou um lance depois?
Dei mais um golaço e prossegui.
-- Conversamos de tudo. Quer dizer, ela me deixou tímido – ou intimidado—no início. Aí, com o tempo, fui soltando a língua, tentando um lance de sedução. Tudo muito pueril, mas que parecia encantar à Kill, que ia rindo, erguendo as sobrancelhas e pontuando o meu show de garnisé.
-- Ha ha... Imagino...
-- Foi horrível. Mas, no fundo, percebi que ela curtia esse meu lado infantil, descabeçado, babaquinha... E, lá pela sobremesa, já estávamos nivelados e ela me falava dos planos para um show e do livro de poemas que andava escrevendo. Quando terminamos o jantar, me senti em casa... Mas aí...
-- Aí?....
-- Quando chegamos à rua ela me disse que tinha que dormir cedo por conta de um trabalho na manhã seguinte. Colocou a mão no meu rosto, como se me consolasse e disse-me que poderia acompanhá-la até em casa.
-- Você deu-lhe um chega, pelo menos, nessa tua negra Zulu?
Fingi que não ouvi e continuei minha história depois de mastigar uma batata frita.
-- O caminho até a casa da Kill era curto. E então fomos andando, devagarzinho, esbarrando um no outro daquele jeito meio namoro, sabe? Eu assim meio que constrangido de novo pela diferença de altura, mas pertinho dela. Dava pra ouvir o fru-fru da lingerie por debaixo do vestido. Uma coisa!
-- Humhum.
-- Quando chegamos ao portão de entrada do prédio, ela me disse obrigado e me abraçou. Quer dizer, me enrolou nos braços dela, me ninou, me confortou... Mas depois me beijou a boca...
Cheguei mais para frente. Era um grande lance que merecia ser contado com a intensidade que eu sentia.
-- Epa, Carlos, então pelo menos um amasso rolou.
-- Rolou que, depois do beijo, ela me tomou no tal abraço! Fiquei com o rosto colado nos seios perfumados dela. Imagina a diferença de altura...
-- Mas você é baixinho mesmo...
-- Baixinho porra nenhuma. Um metro e setenta e três não é baixinho. Principalmente aqui nessa porra de Brasil...
-- Tudo bem... hahah... Tudo bem... E aí?
-- Aí que se você pensa que fiquei de pau duro imediato está enganado...
-- ...
Meu amigo pediu mais dois chopps pro garçon, olhou para mim e fez um gesto com o queixo.
-- Pois é, Zé. Entrei foi num transe daqueles. Tive taquicardia. Enterrei o nariz na carne doce da Kill. Me agarrei nela como um náufrago! Nem tirei sarro nem nada. Fiquei assim um tempão. Até que me dei conta. E me afastei. Ela sorriu e, de novo, passou a mão do meu rosto... “Carlinhos...” me disse... Foi aí que me dei conta de que meu pau tinha, a final, ficado duro e me afastei mais, ficando de lado e tentando não dar na pinta.
-- Parece um guri, Carlos.
-- Pois é... A Kill também achou, tanto assim que se despediu depois de olhar pra ele e sorrir. Depois deu um bye e entrou.
-- Cara, que legal e que frustrante ao mesmo tempo... Vocês vão se encontrar de novo?
-- Sinceramente? Não sei. Ela é meio reticente, não tem agenda livre, está sempre viajando. Não sei mesmo.
-- Que droga!
-- É o que eu digo, Zé, uma negra Zulu te desmonta. Você imagina que voltei no vôo pra casa pensando nela o tempo todo? Imaginando a lingerie preta, os seios grandes na minha boca... Mas aí, quando fechei os olhos, só sentia aquela coisa intensa, e a paisagem mudava... eram cachoeiras, junglas, poentes, uma vertigem de regiões muito profundas do meu inconsciente. Acordei com o avião batendo no solo e gritando “mamãe!”. Pode?
-- Eu que não quero uma negra Zulu na minha vida!
-- É, Zé...
Levantei-me e, antes de rumar para o toilette, sentenciei.
-- Mesmo que ela me chame, não sei se vou vê-la. Tenho medo de não voltar... Ou de ficar ainda menor...
Perov = 01mar12
Para F/, a Negona.