sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O Mar do Leblon

Desde que me lembro, o mar do Leblon sempre sofreu de um mal causado por nós, cariocas: a nata de sujeira que diariamente vem lá de fora e vai chegando até secar na areia. Essa cicatriz móvel de mau-cheiro maltrata a fauna marinha e a nós, banhistas. De quebra, faz-nos repugnar essa grande beleza que é a massa d’água salgada e em movimento!

Recentemente tenho interpretado esse estado de coisas sob outra perspectiva. Sento-me na areia e fecho os olhos; e ouço o choro de Yemanjá... Nem esse Orixá tão poderoso consegue processar diariamente as toneladas de detritos que nós, por tanto tempo e tão consistentemente, enviamos ao mar. Minha Mãe está triste porque, sendo a divindade do Amor, por excelência, tem em volta de si, em si mesma, a marca do desamor. E aí penso que sem o Homem não há Orixá e que essa relação é muito perversa, pois a vingança divina seria necessariamente auto-destrutiva. Compreender essa verdade me leva a entender a utilidade do Amor e a perceber como necessitamos dele, tanto espírito como matéria.

Esta semana estive na Praia de Boa viagem, Recife. Outro mar, outra areia. Da janela do quarto fiquei observando o oceano e registrando o movimento das marés. De manhã maré vazante, os banhistas passeando na areia e tomando "banho de assento" nas piscinas formadas pela barreira de recifes; de tarde maré cheia e os banhistas nadando ou recolhendo-se ao calçadão de areia. Minha Mãe de outras roupas, minha mãe tão bela sempre!

Na hora de partir para o aeroporto dei o último vistaço para o mar. E vi, surpreso, a "nata de sujeira" chegando à areia -- detritos, sacos de plástico, pedaços de madeira, debris... E pensei, entristecido como eram semelhantes essa praia e a minha...

09fev01

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