sexta-feira, 4 de junho de 2010

A Equação de Donna


Quando adolescente, DONNA tinha problemas com as aulas de matemática. Passava raspando e quebrava o pau se alguém lhe mostrasse um problema de Aritmética, Álgebra ou mesmo Geometria Descritiva.

Naquele tempo DONNA já mostrava o temperamento esfuziante que hoje encanta a todos - sejam eles gregos ou troianas (sim, há um séqüito de DOMMES & ESCRAVAS que persegue DONNA por todos os lados, prometendo mundos e fundos - especialmente estes últimos). Líder da torcida da escola, DONNA exibia a bunda empinada que fez a loucura de muitos, falava pelos cotovelos e fumava desbragadamente.

O diabo, a pedra no sapato Vulcabrás de DONNA, era essa falta de pendor para os números. "Números me atrapalham!", ela anunciava, orgulhosa. E, na verdade, DONNA nunca fez contas direito, aproveitando este presumível defeito para tornar-se uma das pessoas mais generosas do bairro.

Ao formar-se no Educandário Nossa Senhora das Graças, DONNA foi escolhida para ser a oradora da turma, já que gostava de falar e comunicava-se com facilidade. Chegado o seu momento triunfal, DONNA botou de lado o cigarro, subiu ao palco, limpou a garganta e iniciou aquilo que viria a ser o mais surpreendente discurso de formatura da história do Educandário: após agradecer a banca de professores, a começar pelo "seu" Mamede, Professor de Matemática e Diretor da Casa, DONNA saudou o paraninfo, Prof. Eustáquio, conhecido por distribuir notas altas a todos, principalmente às alunas da primeira fila que usavam saias mais curtas do que a inteligência delas.

E foi indo, indo, falando de liberdade, da importância do ensino como instrumento para construir o futuro ("Aluno aplicado, futuro assegurado"), dos colegas que partiram e daqueles que ficaram, da amizade entre os povos... Até que, em dado momento, perdeu a folha e o ritmo e acabou por tropeçar no fio do microfone, revelando um par de calcinhas digno da Madonna. Foi então que os mais mimosos fizeram "ahhhhhhhhh" e os mais velhacos começaram a rir.

A coisa foi ganhando um vulto tal que dali a pouco uma estrepitosa gargalhada tomava conta do Ginásio Esportivo do Educandário Nossa Senhora da Graça. Até que a gargalhada foi, pouco a pouco, diminuindo, diminuindo, enquanto DONNA recobrava o fôlego e a compostura. E eis que, no momento em que o silêncio retornou à platéia , DONNA, com o microfone apertado na mão disse, em claro Português, de enfiada: "olha só... vocês todos: VÃO TOMAR NO CU E FODAM-SE!"

Depois de muita balbúrdia, a festa de colação seguiu em frente, com alguns professores constrangidos de terem que dar dois beijinhos na oradora e outros exagerando nos abraços com ela. Houve até uma certa professora que, não agüentando-se, deu uma palmadinha nas insolentes nádegas da formanda.

O evento, como disse, ficou na História. E lá foi DONNA viver a vida como ela é. Até que um dia, sem mais nem menos, topou por acaso com o Prof. Mamede. Sim! Aquele mesmo. O professor de Matemática.

Cumprimentaram-se cautelosamente e DONNA pode observar como o seu antigo mestre era gentil e delicado. Dali da rua foram tomar um café e, do café, dirigiram-se ao apartamento de Mamede com o fito de trocar idéias sobre um mirabolante projeto que tinha como propósito traduzir frases da língua Portuguesa para precisos enunciados matemáticos.

Chegando ao apartamentinho de solteiro de Mamede, DONNA pôs-se à vontade, acendendo um cigarro e passeando pela pequena sala de estar. Mamede, meio sem jeito, indicou-lhe a porta do banheiro, “caso necessite”, e foi à cozinha buscar um balde com gelo.

Servido o Red, sentaram-se no sofá (sempre esse sofá) e começaram a parlar. E de parlatório em parlatório surgiu o primeiro beijo. E logo-logo os belos seios (com mamilos rosados, embora ela diga que são marron-claros) de DONNA estavam nas mãos sôfregas de Mamede; enquanto o pirú de Mamede brilhava envernizado nas mãos de DONNA.

Vai que vai e lá estavam os dois se arreganhando e em posição quando Mamede, num golpe romântico, decide regalar à DONNA a obra de arte de uma vida inteira.

Desencaixando-se, Mamede pula à frente de DONNA e diz que irá elaborar uma equação que traduza, exatamente, o desenho do corpo da ex-aluna, incluindo retas, ângulos e curvas traduzidos por senos e co-senos de tal precisão que DONNA ficaria para sempre transformada em monumento vivo à mais cruel das ciências matemáticas.

Manejando furiosamente régua e compasso, transferidor e tabelas, Mamede debruçou-se sobre o corpo de DONNA como um Beethoven sobre o piano, tirando dos membros, costelas, seios, ancas, coxas e pés notas graves e agudas, acordes maiores e menores até que, gozando abundantemente, em progressão geométrica, levou DONNA ao paroxismo trigonométrico.

Naquele dia, naquele momento, os olhos de DONNA deixaram de ser castanhos para assumir a cor verde-borrasca – uma de suas marcas registradas. Fixados em qualquer mortal, estes olhos, às vezes implacáveis, às vezes mendigos, deixam cicatrizes indeléveis. Tão eternas quanto a enorme equação que hoje adorna o painel de entrada do Educandário Nossa Senhora das Graças, sem que ninguém saiba o porquê daquela homenagem.

Para minha amiga eterna, DONNA, cujo real é muito mais belo do que o virtual que aqui vemos.

[29jun09]

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